| Em lugares caríssimos de primeiro balcão com vista para a Lua cheia que ilumina o escuro telhado do Hotel do Bairro Alto e o topo da Igreja da Nossa Senhora da Encarnação. Minutos de preciosidade antes da corrida para o acumular de estampidos no caminho para casa. Esqueço-me de respirar na azáfama do pressionar de teclas que, com frio, se senta ao meu lado. Separa-nos o espaço de um corpo, mas sei que nenhuma meterá conversa. Ela espera outros. Não, não vamos falar. A não ser que... Sorrio. Falso alarme. Retalhos de nuvens atravessam o luar, perdem a forma, agrupam novos corpos no espaço do olhar, levam tudo para depois desaparecerem no azul que se adivinha do céu. O banco sob as pernas estremece à passagem do eléctrico. A minha vizinha enrola um cigarro na paciência vã de quem aguarda alguém que é certo. – Importa-se que eu fume? – Não, não, eu também já estou de saída. Sorrio de novo. É que estou mesmo, espero não ter de correr para o comboio. – Mas obrigada por ter perguntado – tenho ainda tempo de dizer, no virar de costas. Afasto-me satisfeita no olhar de reconhecimento que me recebe. A perna continua traçada debaixo da saia escocesa. Olhar expectante de conversas nocturnas, fios de cenoura sobre olhos que acredito verdes. O cigarro descansa paciente entre os dedos. Afinal, sempre falámos. |